Megi Monique Maria Dias
INTRODUÇÃO
O Instituto Histórico e Geographico
Paranaense nasceu em meio a ideia de edificação da escrita da história,
sustentado pela aura patriótica de comemoração ao IV Centenário do Descobrimento do Brasil e, simultaneamente,
do 47º ano da Instalação da Província do Estado do Paraná. A rigor, esse evento
ganhou notoriedade na imprensa local no jornal A Republica sendo publicado como uma solenidade.
O imaginário republicano se fazia
presente em diversas esferas: era publicado em jornais, nos periódicos e em
revistas, verdadeiros porta-vozes da manifestação desse ideal. O principal
responsável pelas críticas à Monarquia foi o jornal A República, órgão que veiculou a notícia histórica de fundação do IHGP e que serviu no Paraná para a
divulgação das ideias republicanas, ferrenho crítico das manobras políticas
feitas pelo Império e por seus partidos de sustentação (PEREIRA, 1998). O
periódico surge como primeira impressão dos republicanos na capital paranaense
em 1886 e é extinto em 1930, completando 44 anos de existência (CORRÊA, 2006).
A questão nacional movimentou o
pensamento dos intelectuais brasileiros no início do século XX sendo que fazer
a história da pátria era um exercício cívico. Informações sobre esse debate
podem ser encontradas em Lúcia Lippi de Oliveira (1990), sobretudo, a
investigação histórica que realizou sobre as origens do nacionalismo no Brasil,
principalmente, o da I República, momento privilegiado pela autora em sua
análise do universo da cultura política da sociedade brasileira.
Divulgada como Notícia Histórica, a nota
trazia à disposição os nomes de “pessoas
que (...) se preocupam com os assumptos de que pretende ocupar-se o Instituto”(Boletim
do IHGP, 1918, p. 06). Na ocasião,
Romário Martins, um dos principais idealizadores desse projeto, exprimiu
algumas preocupações pertinentes ao seu tempo e que considerava como condições
necessárias para o desempenho das tarefas do Instituto em prol do Estado do
Paraná e, por consequência, da Pátria. Para ele, “critério, patriotismo e trabalho” (Boletim do IHGP, 1918, p. 6).
DESENVOLVIMENTO
TEÓRICO-METODOLÓGICO
Para os festejos de inauguração do
IHGP, foram convidados representantes da
elite local que viam nesse evento uma oportunidade de inserção num
cenário de discussões e produção de saberes, além de significar para alguns a
conquista de visibilidade perante uma elite letrada e restrita. A festividade
contou com a participação de figuras proeminentes da sociedade paranaense,
nomes de “pessoas que [...] se
preocupam com os assumptos de que pretende ocupar-se o Instituto”, conforme
anunciava o próprio periódico da instituição (Boletim do IHGP, 1918, p.
06). Essa nomeação fazia parte do ritual de legitimação do panteão cívico que a
história da República buscava firmar através dos seus discursos e produções
historiográficas os movimentos de construção dos heróis e dos símbolos
nacionais. Seguindo essa tendência, segue-se abaixo o público a que se
destinava esse empreendimento,
“[...] o Dr. Sebastião Paraná, Dario
Velloso, General J. Bernardino Bormann, Dr. Emiliano Pernetta, Dr. Candido de
Abreu, JulioPernetta, Nestor de Castro, Dr. Manoel Ferreira Correia, Lucio
Pereira, Capitão José Muricy, Coronel Jocelyn Borba, Dr. Camillo Vanzolini,
Luiz Tonisse, Dr. Ermelino de Leão e Desembargador Bento Fernandes de Barros.
No entanto, reunidos no Club Curytibano, estavam os cidadãos: Romário
Martins, Julio Pernetta, Dr. Sebastião Paraná, Dr. Camillo Vanzolini, Dr. Luiz
Tonisse e Dr. Ermelino Agostinho de Leão.” (RIHGR, Vol. I, 1918, p. 8) Não
compareceram, mas justificaram a ausência por motivos de ordem pessoal os
cidadãos: General José Bernardino Bormann, Coronel Jocelym Morosini Borba,
Dario Velloso, Dr. Manoel Francisco Ferreira Correia, Dr. Emiliano Pernetta e
Nestor Pereira de Castro; Não compareceram e nem justificaram ausência:
Desembargador Bento Fernandes de Barros, Dr. Candido Ferreira de Abreu, Tenente
José Candido da Silva Muricy e Lucio Pereia.” (Boletim do IHGP, 1918, p. 08).
Ao analisarmos o percurso do grêmio
entre os de 1900 e 1925, a fim de perceber os antecedentes institucionais que
promoveram a publicação dos Boletins, verificamos o seu percurso instável,
marcado por intensas dificuldades e de inúmeras tentativas de reorganizações
revelando uma série de problemas estruturais que acabaram adiando suas
atividades de pesquisa, dentre as quais se inseria a consolidação da publicação
de seus periódicos. Notamos que as atividades do grêmio se realizavam de acordo
com a frequência dos encontros dos integrantes e das aproximações entre os
membros em prol da execução desse projeto cultural que buscavam manter ativa as
atividades do grêmio e dar continuidade na publicação de estudos científicos
referentes ao Paraná. Em nossas análises podemos observar alguns aspectos do
perfil da política de publicação da entidade, cuja participação nos editoriais
se dava principalmente através da atividade dos membros no executivo da
instituição.
Mesmo em âmbito de reunião, ainda no
salão onde se davam as comemorações acerca da fundação do Instituto, decisões
sobre os nomes que comporiam a diretoria e até mesmo quem daria prosseguimento
a reunião eram assuntos debatidos pelos idealizadores do Instituto Histórico e
Geográfico Paranaense. A Assembleia que aprovou o instrumento normativo do
IHGP, através do estabelecimento das propostas em Estatuto e lhe concedeu
direito de funcionamento, aconteceu no dia 03 de Junho de 1900, na cidade de
Curitiba, mediante a definição dos programas e das atividades que deveriam ser
priorizados pelo grêmio. Tais demarcações
dessas orientações podem ser observadas na composição do seu Estatuto, cuja
Comissão responsável por redigir tal documento contou com a participação de
nomes como Romário Martins, Camillo Vanzolini e Dario Velloso, nomeados pelo
General J. Bernardino Bormann, presidente do IHGP na diretoria composta aos 24
de maio de 1900.
É importante destacar as
contribuições dos intelectuais acima citados, Alfredo Romário Martins
(1874-1948) nasceu em Curitiba. Tipógrafo,
jornalista, desempenhou vários cargos públicos como, o de Oficial da
Secretaria de Obras Públicas e Colonização, o de Diretor do Museu Paranaense,
além de, membro do Centro de Letras do Paraná foi também um dos fundadores do
Instituto Histórico e Geográfico Paranaense, sendo laureado pela entidade com o
título de ‘Presidente Perpétuo’. Ativo na questão de limites entre Paraná e
Santa Catharina, publicou inúmeros trabalhos sobre a questão. No campo
político, foi eleito deputado ao Congresso Legislativo em 10 legislaturas
(MENDES et. al., 2013, p. 88-89). Inserido definitivamente no cenário político-cultural
paranaense após a publicação de sua obra História do Paraná, onde Romário Martins, apresenta um
rol de detalhes acerca do Estado do Paraná (IURKIV, 2002, p. 128).
Por sua vez, Camillo Vanzolini, era italiano,
residente em Curitiba, era médico, demonstrando a presença do imigrantes e sua
integração a sociedade paranaense mediante a participação em associações
culturais, à exemplo do IHGP (BELTRAMI, 2002). Já Dario Persiano de Castro
Vellozo nasceu no Rio de Janeiro (1869-1937), mudou-se para Curitiba anos mais
tarde. Conviveu com talentos do seu
tempo, entre os quais Ermiliano Pernetta, Romário Martins, Nestor Victor,
Leôncio Correia e Olavo Bilac (MENDES et. alii, 2013).
O reduto paranaense contou com a
presença de militares, parlamentares, escritores, jornalistas, engenheiros,
médicos, dentre outras profissões liberais, uma constante entre os sócios,
sobretudo nos vinte e cinco anos iniciais de atividade do grêmio. Em relação à
definição das categorias Dos Socios,
consta em seu Estatuto que seriam seis: fundadores, efetivos, beneméritos,
honorários, correspondentes e auxiliares (Cap. III, nos artigos I ao VI – 03 de
Junho de 1900; Boletim do IHGP, 1918, p. 19-20).
A possibilidade de se discutir o
Instituto Histórico e Geográfico Paranaense e suas contribuições para formação
da história da sociedade paranaense inclui a percepção do legado que esse
espaço significou para a construção de um passado da história do Estado do
Paraná, além disso, com a vasta produção intelectual seus agentes seriam
responsáveis por colocar em prática, no início do século XX, um projeto
político de cunho científico-cultural que revela aspectos históricos e
encaminhamentos específicos cruciais para a compreensão das nuances do ofício
de escrever história daquele tempo.
Na pesquisa sobre a trajetória do IHGP,
e dos discursos contidos nas publicações do grêmio desenvolvida por Larissa
Rosevics (2009), O Instituto Histórico e
Geographico Paranaense e a Construção de um Imaginário Regional, a autora
afirma ser o Instituto um lugar que passa a instituir significados no âmbito do
imaginário e no simbólico, aspecto esse que seria evidenciado justamente em
decorrência da sua inatividade em alguns momentos da instituição. Isso nos faz
refletir sobre as instabilidades estruturais a que esteve submetida,
significando um projeto cultural que delegou ao Paraná a autoridade de possuir
um espaço cultural de produção de história nacional. Embora reafirmar a ideia
de Paraná seja assumir seu compromisso histórico com o nacional, buscamos
perceber a importância do IHGP na definição dos parâmetros e na construção de
uma história do Paraná.
Além de outras intenções que
possuía o IHGP, existiam as que versavam sobre a sua estabilidade e progresso e
que estavam previstas em seu Estatuto, como por exemplo, a garantia da execução
das propostas elaboradas neste documento sobre as atividades da Diretoria, à
ela competia também, “Nomear comissões para o estudo de trabalhos scientíficos
apresentados ao Instituto por sócios ou extranhos” (Cap. II, Art. 8º, inciso 3
– Da Diretoria; Boletim do IHGP, 1918, p. 19) e “Organisar o Regimento Interno
do Instituto, Bibliotheca e Archivo Publico” (Cap. II, Art. 8º, inciso 4 – Da
Diretoria; Boletim do IHGP, 1918, p. 19) o que demonstra que suas atividades e
influências se estendiam para além dos círculos do IHGP.
Os problemas vivenciados pelo
Instituto poucos anos após a solenidade de fundação favoreceram para que parte
das intenções desta entidade não fosse cumprida com algumas tentativas de
reorganização empreendidas sem sucesso. Por meio da formação de sucessivas
Diretorias (antes da publicação de sua primeira revista), o Instituto buscava a
manutenção de sua existência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A criação de Instituições científicas do
porte do Instituto Histórico e Geographico Paranaense foi conduzida pela elite
local de Curitiba como uma notícia
histórica, o que demonstra como tal grupo
buscava solidificar e ampliar os espaços de sua atuação e da circulação
dos ideais republicanos no Paraná expandindo suas atividades através da criação
e uma porção de centros e associações literárias, bem como revistas, jornais e
toda uma série de produções históricas e de espaços culturais e sociais,
utilizados para consolidar um projeto político cultural específico para o
Paraná. O Instituto significaria uma associação ímpar no ramo das pesquisas
científicas, isto porque pela primeira vez
os conhecimentos da história e da geografia não estariam subsumidos às
demais áreas, representando, portanto, o início de uma trajetória de sistematização
dos conhecimentos produzidos pelo grêmio.
Destinado, então, a promover e estimular todas as iniciativas
úteis ao progresso e à civilização, o IHGP pode ser observado a partir das
preocupações que o norteavam. Uma delas era a busca por se instituir no Paraná
uma história que o fizesse ser reconhecido aos seus, a si e à Nação, pautada na
crença no progresso e no desenvolvimento social. Levando em conta que no Brasil
esse ideário atingiu o apogeu nas duas primeiras décadas do século XX, a
proposta do grêmio estava em consonância com as preocupações daquele tempo.
Assim, buscou-se ressaltar algumas
características deste espaço nos quais os saberes circulavam e daqueles que
promoveram sua difusão, de forma que o que nos interessa averiguar são os
procedimentos e escolhas históricas da produção científica através dos quais se
realiza a construção do conhecimento histórico brasileiro. Ao compreender o
IHGP como um espaço dinâmico do debate das idéias correntes e dos múltiplos
conhecimentos de Brasil devemos ser considerar a seleção e inserção das
temáticas que obtiveram o aval da história numa configuração coesa e homogênea,
mesmo diante de um Brasil historicamente tão heterogêneo.
FONTES E REFERENCIAIS BIBLIOGRÁFICOS
Megi Monique
Maria Dias. Guarapuava-PR. Universidade Estadual do Centro-Oeste / UNICENTRO. Possui
graduação em História pela UNICENTRO-PR (2009); É Mestre pelo Programa de
Pós-Graduação de História da UNICENTRO-PR (2016); E-mail: megidias1@gmail.com;
FONTES
Boletim do Instituto Histórico
e Geographico Paranaense. Livraria Mundial: Curitiba, 1918.
REFERENCIAIS BIBLIOGRÁFICOS
PEREIRA, Luís Fernando. PARANISMO: O Paraná inventado; cultura e
imaginário no Paraná da I República. 2. Ed. Curitiba: aos quatro ventos, 1998.
CORRÊA, A. S. Imprensa e política no
Paraná: prosopografia dos redatores e pensamento republicano no final do séc. XIX.
Dissertação (Mestrado em Sociologia), UFPR: Curitiba, 2006.
MENDES, Antônio Celso et. al.; Um século de cultura: História do Centro de
Letras do Paraná 1912-2012. Núcleo de Mídia e Conhecimento: Curitiba, 2013.
IURKIV, José Erondy. Romário Martins e
a Historiografia Paranaense. In: Educere – Revista da Educação, p.
123-132, vol. 2, n. 2, jul./dez., 2002.
BELTRAMI, Rafael C. de C. Da Poesia na Ciência – Fundadores do
Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, uma história de suas idéias. Dissertação
(Mestrado em História) – UFPR: Curitiba, 2002.
ROSEVICS, Larissa. O Instituto Histórico e Geographico Paranaense e a construção de um
imaginário regional. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – UFPR, Curitiba,
2009.
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